Arquivo pessoal Confesso que a ideia de ser pai me apavorava.
Apesar do “test drive” com os sobrinhos agregados, eu ainda carregava um caminhão de dúvidas. Coisas do tipo "como é que eu vou amar uma criança ou que sentimento é este?"
Nada mais era do que o medo do desconhecido.
Em meados de novembro de 2000, eu fui privilegiado com um sonho estranho. “Tu vens, tu vens, eu já escuto os teus sinais.” Era o recado de que alguém estava chegando. Guardei a anunciação em meu coração.
Dois meses depois, o medo e o sonho deram lugar a uma gostosa loucura. A notícia de que uma pessoinha estava a caminho causou uma revolução dentro de mim.
Tão logo comprovada, lembro-me de ter ido contar aos meus pais.
Minha mãe, claro, ficou emocionada e preocupada. Era uma época difícil. Eu estava sem “emprego fixo”, trabalhando apenas como músico.
Meu velho pai, com os olhos marejados, disse apenas que tudo ia dar certo.
A primeira consulta ao obstetra, as batidas do coração registradas numa fita microcassete, o exame de ultrassom mostrando o pintinho do bebê, a compra dos móveis e a reforma da casa.
São as memórias que guardamos no coração.
No dia dez de agosto, uma sexta-feira, às 8h10, Guilherme deixou a proteção da mãe e bradou a sua chegada ao mundo.
Chorei com a dona Odete no hospital.
Mas faltava contar a novidade e chorar com o outro homem mais importante da minha vida.
Meu pai estava em casa terminando um serviço. “Teu neto nasceu, Fredão!” Nos abraçamos e choramos.
Três dias depois eu comemorei o meu primeiro dia dos pais com o meu pai e o meu filho.
Como não ser grato?
Guilherme possui o doce e estranho poder de me fazer chorar, rir, refletir, lutar, mas principalmente, de renovar a minha fé.
Ele me faz acreditar que fui escolhido para ser abençoado com a sua presença. Aprendo muito mais do que penso ensinar. Ele é a razão pela qual a caminhada, apesar de todas as adversidades tornou-se diariamente prazerosa.
Ele é o milagre traduzido em vida. A prova material, incontestável e definitiva do amor do mistério que a minha alma insiste em chamar de Deus, por mim.
Depois dele consegui entender o meu velho pai.
Sua preocupação em não errar e o seu modo esquisito de conversar.
Seus medos, falhas, limitações, jeitão ranzinza, mas acima de qualquer coisa, o seu desmedido amor e dedicação em tornar o meu caminho mais feliz.
Neste Dia dos Pais de 2022, eu confesso que ainda tenho medo.
Ser pai é uma aventura e tanto.
Tento ser para Guilherme um pouquinho do que o velho Fredão é para mim. Não é tarefa fácil. Nesta arte ele sempre será mestre.
E eu?
Bem, eu sou iluminado pelos sóis dos amores do meu pai e do meu filho.
Com eterna gratidão e amor.
(*) Atualização do texto escrito no dia dos pais de 2007.