Uma Ação Civil de Improbidade Administrativa – Processo 1005110-53.2017.8.26.0038 - movida pelo Ministério Público contra o ex-prefeito Nélson Dimas Brambilla, os ex-secretários de Saúde, Francisco Nucci Neto (excluído da lide no decorrer do processo) e Vandersi Pavan Bressan, além da ex-presidente da Associação de Moradores do Parque das Árvores (AMPA), Sílvia Helena Dalmazzo Barreto, teve a sua sentença em primeira instância conhecida na semana passada.
O caso versa sobre o convênio firmado entre a Prefeitura de Araras e a AMPA, que forneceu mão de obra para a Administração desde 2002, quando o médico, à época exercia os cargos de vice-prefeito e secretário de Saúde na Gestão Meneguetti (2001-2004). Na prática, a associação que deveria tratar dos assuntos e demandas do bairro, era utilizada para as contratações não apenas de médicos, mas também de outros profissionais, como dentistas, enfermeiros, agentes de saúde e serventes, dentre outros, alocados nas unidades de saúde do município. No ano de 2006, no segundo mandato de Meneghetti, a Lei Municipal nº 3.848 “regulamentou” o convênio.
Na ocisão, a justificativa era de que a contratação direta seria mais eficiente do que o concurso público, principalmente em razão da dificuldade em manter os médicos nos quadros da Prefeitura (entenda-se fazê-los cumprir a sua carga horária). Este, aliás, continua sendo um dos calcanhares de Aquiles das Administrações. Entretanto, em maio de 2010, o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE) verificou que dos 130 funcionários contratados pela AMPA, apenas 64 eram médicos, o que revelou “a indevida intermediação de mão de obra”.
Em alguns trechos de sua decisão, o juiz da 2ª Vara Cível, Matheus Romero Martins, não deixou dúvidas quanto ao seu entendimento acerca da conduta dos gestores, o desvio de finalidade e a irregularidade do convênio. “Ainda que não houvesse concurso público vigente, a excepcionalidade do quadro apresentado justificaria a contratação temporária desses profissionais pelo próprio Município de Araras enquanto não fosse aberto concurso público voltado ao provimento de cargos efetivos (Art. 1º, inciso I, da Lei Complementar Estadual n. 1.093/09 c/c art.2º, inciso II, da Lei Federal n. 8.745/93).”
Em outra parte, Martins afirma que “vislumbra-se que o ex-Prefeito Nelson Dimas Brambilla atuou em conjunto com a então Secretária de Saúde Vandersi Pavan Bressan na celebração do convênio n. 45/2010 (fls. 180/193), além dos respectivos aditivos de n. 027/2012 (fls. 202/209) e 038/2013 (210/216), perante a Associação de Moradores do Parque das Árvores AMPA. Tais pactos tinham como objeto a contratação de profissionais da área da saúde com vistas a garantir o funcionamento do Hospital Municipal Elisa Sbrissa Franchozza.”
O juiz ainda considerou que “O Sr. Nelson Dimas Brambilla preferiu continuar o vínculo espúrio com a ASSOCIAÇÃO DE MORADORES DO PARQUE DAS ÁRVORES AMPA, efetuando repasses à ordem de R$10.838.850,00 (dez milhões, oitocentos e trinta e oito mil e oitocentos e cinquenta reais), entre os anos de 2009 e 2013. Em acréscimo, como bem observado pela ilustre Promotora de Justiça, entre os anos de 2010 e 2013 o então Prefeito Municipal não realizou um concurso sequer para o provimento de cargos de médico, conforme mencionado em sua própria contestação (fls. 586/587) e corroborado pelos documentos de fls. 625/626, 627 e 745/911."
O TCE também apontou o desvio de finalidade da associação. “A Unidade Regional de Campinas concluiu pela irregularidade da matéria, apontando o quanto segue: a) o objeto social da Entidade não é compatível com o objeto do Convênio; b) a finalidade do Ajuste resume-se contrafação de pessoal pela Associação, para prestação de serviços em Prefeitura a realização de concurso público para a contratação de pessoal, não podendo se valer da terceirização para tanto; d) não foi comunicada ao Poder Legislativo a celebração do Convênio; e) não foi atestada a economicidade do Ajuste; f) a Entidade não possui declaração de utilidade pública; g) não foi elaborado plano de trabalho h) o Convênio não possui cláusulas essenciais (meta proposta, cronograma de aplicação de recursos e prazo de execução); i) os Termos Aditivos não consignam valor .”
O magistrado considerou inconstitucional a Lei Municipal nº 3.848 de 17 de março de 2006, que "regulamentou" o convênio. “Aqui, impende salientar que a referida lei municipal possui manifesta inconstitucionalidade que deveria ter sido verificada de pronto não só pelo então Prefeito Municipal, mas, também, pelo corpo de Procuradores do Município de Araras. Portanto, o seu caráter aberrante retira toda e qualquer possibilidade desse texto normativo servir como escusa legítima para a edição desses ajustes”, apontou Matheus Romero Martins.
O juiz é taxativo ao afirmar “o claro indício sobre a malversação das verbas obtidas pela ASSOCIAÇÃO DOS MORADORES DO PARQUE DAS ÁRVORES, considerando que, entre os anos de 2010 e 2013, o número de pessoal contratado foi gradualmente reduzido, mas os respectivos gastos permaneceram em um mesmo patamar [...] Destaca-se que no ano de 2013 o valor dos repasses atingiu as cifras de R$2.781.690,00, correspondentes aos serviços prestados por 6 (seis meses) pelo reduzido número de profissionais que ainda possuíam vínculo.”
No que se refere à sentença, Martins decidiu pela “suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos, a contar do trânsito em julgado da presente demanda; ressarcimento pelos danos causados pela prática do ato de improbidade administrativa, a serem apurados em sede de liquidação de sentença; proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 3 (três) anos, de Brambilla, Vandersi e Silvia.
O ex-prefeito e a ex-secretária foram condenados ao “pagamento de multa civil correspondente a 50 (cinquenta) vezes o valor da última remuneração por eles percebida, acrescida de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês e correção monetária pela tabela prática do TJSP.”
A AMPA, por sua vez, está “proibida de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 3 (três) anos. Além do ressarcimento pelos danos causados pela prática do ato de improbidade administrativa, a serem apurados em sede de liquidação de sentença.”
Procurados pela reportagem de O Independente, o ex-prefeito Nélson Dimas Brambilla e a ex-secretária de Saúde, Vandersi Pavan Bressan não retornaram ao contato. A ex-diretora da Associação dos Moradores do Parque das Árvores (AMPA), Sílvia Helena Dalmazzo Barreto, conversou com a reportagem, mas não fez declaração oficial sobre o assunto.
A sentença é em primeira instância e ainda cabe recurso da decisão.